Se você pensa em se mudar para a Europa em busca de uma vida diferentona, aprendizado, crescimento profissional ou o que quer que seja, certamente dúvidas em relação ao mercado de trabalho por aqui e opções para uma carreira acadêmica passaram pela sua cabeça. Aqui neste post eu contei sobre nossas motivações para a mudança, em suma, buscar uma vida mais simples, mais conectada a Deus e porque o equilíbrio entre nosso tempo no trabalho e o tempo dedicado aos filhos nos motivou a fazer tudo isso. Se você se identifica de alguma forma com o nosso porquê, abaixo deixei as alternativas que encontrei até então na Holanda sobre opções de trabalho mais flexíveis em relação ao tempo dedicado entre carreira e filhos. Eles realmente curtem ter filhos por aqui e super valorizam a família. Não é à toda que por vários anos consecutivos as crianças holandesas levam o título das mais felizes do mundo. Se ficou intrigado e quer saber mais sobre como é o trabalho por aqui dá uma olhada abaixo.
Trabalhar na Holanda | Por onde eu começo?
Para início de conversa acho válido dizer que não recomendaria de forma alguma mudar de país na cara e coragem para então tentar encontrar um trabalho. Pode ser um movimento muito arriscado, caro e com baixas chances de sucesso. Se você tem este interesse, pague o LinkedIn Premium e comece daí a procurar pelas oportunidades. Amsterdam é uma cidade internacional, que busca profissionais qualificados em todo o mundo e oferece uma grande infraestrutura para receber os expatriados. As empresas estão acostumadas com este processo e fazem tudo à distância. Eventualmente, se o processo evoluir algumas pagarão a viagem para fazer entrevistas pessoais, seu visto e muitas oferecem uma ajuda generosa para a mudança.
A Holanda é um país muito organizado e eficiente. O processo de entrega da documentação no Expat Centre é um show à parte. Hora marcada, sem filas, tudo extremamente rápido e organizado. Enquanto as crianças brincam num espaço criado para elas, os adultos tomam café ou chocolate quente enquanto aguardam por seu cartão BSN que dá acesso a todos os serviços públicos no país.
Um dos incentivos mais importantes para os expatriados que escolhem a Holanda é o 30% ruling, um benefício oferecido para os "high skill professionals" (profissionais qualificados) trazidos pelas empresas para ocupar vagas de especialistas na Holanda. Com este incentivo, o funcionário fica livre de impostos em 30% do seu salário, durante 5 anos (lei em discussão no momento). Mais informações aqui.
Quanto ao idioma, na Holanda estão unidades de várias empresas multinacionais que têm o inglês como idioma oficial, onde não será um problema não falar holandês. Mas é claro, existem as empresas de origem holandesa onde este poderá ser um requisito na contratação, ou mesmo um causador de dificuldades num ambiente onde a maioria das pessoas vem daqui. Vale lembrar que na Europa os profissionais comumente falam duas ou três línguas, então pode ir caprichando neste quesito para melhorar suas chances.
Qualquer dúvida que você tenha neste sentido pode ser respondida neste site. Assim, comece sua busca por aí e candidate-se a algumas vagas para se familiarizar com o processo.
Conseguir um bom trabalho na Europa certamente não é uma coisa simples e talvez dezenas de tentativas te conduzirão ao sucesso (acabo de receber uma negativa para um processo, com certeza a primeira de muitas). Por isso vale dizer que algumas áreas são mais simples que outras. Há por exemplo um mercado muito aquecido e de muitas oportunidades para a área da tecnologia (onde não meu Deus?), mas certamente mais difícil para quem vem da área da saúde e precisa validar novamente o diploma ou da área jurídica, por exemplo, com particularidades na legislação de cada país. Mais uma vez o LinkedIn pode ser seu aliado numa busca rápida para ter uma ideia de onde está se metendo.
Vale dizer que a carga de impostos sobre o salário é bastante alta na Holanda, então, caso tenha dúvidas sobre quanto será seu rendimento líquido faça a simulação neste site.
A dica final neste quesito são os contatos. Conhece alguém que já trabalha por aqui? Então comece a conversar. As empresas estão em busca de talentos e oferecem bônus generosos para profissionais que fazem boas indicações. E, como em qualquer lugar do mundo, ter seu currículo entregue com a indicação de um funcionário da empresa aumenta suas chances na competição.
Trabalhar na Holanda | Work-life Balance
Generalizando um tanto, podemos dizer que na Europa se encontram melhores condições quando falamos sobre o balanço entre trabalho e lazer. Em alguns lugares menos que outros, mas na Holanda até então percebemos isso de forma bastante evidente.
Ninguém por aqui parece trabalhar 14 horas por dia, comer sobre a mesa respondendo os e-mails e ainda sair correndo pra fazer aquele MBA à noite. Claro que não é o paraíso, mas parece não haver aqui tantos projetos com o famoso prazo "é pra ontem", que eventualmente são cancelados na semana seguinte.
As pessoas trabalham basicamente o número de horas estabelecidos no contrato (normalmente das 9 às 17 hs, com 30 minutos de almoço), tiram um dia de folga se faz sol (tem que aproveitar) e tem suas atribuições bem definidas. As empresas que recebem muitos expatriados sabem trabalhar bem com a diversidade, com os diferentes fuso-horários, dress-codes e skills.
Este é inclusive um ponto que me encanta aqui na mesma proporção com que me entristece lembrar de algumas experiências profissionais que tive no passado. As mulheres ocupam posições de liderança e parece existir bem menos diferenças de gênero. A maneira como você se veste, quantos anos têm, que carro dirige e outros símbolos que em nada retratam a capacidade profissional importam menos. Uma amiga comentou esta semana que a CEO da empresa onde trabalha, uma das mulheres mais poderosas nesta indústria, estava ao lado dela pegando a bike para ir pra casa, de calça adidas e tênis. Na entrevista que fiz a gerente da área parecia mais nova que eu e estava de moletom. Eu acho isso o máximo. Ela foi super acessível, humilde e me mostrou porquê estava ali. Era qualificada para aquela posição, simples assim.
Na Holanda as férias são de 24 dias úteis (na verdade esta quantidade muda conforme empresa e tipo de contrato), que vão sendo liberados proporcionalmente, ou seja, 2 dias ao mês. Assim, se você quiser pode tirar estes dias da maneira como convier, fazendo umas escapadas sempre que possível para passear (ou cuidar de um filho doente, por exemplo), já no primeiro mês. Se sair da empresa antes dos 12 meses o saldo devedor é descontado. As férias são remuneradas, não tem décimo terceiro salário mas a maioria das empresas tem algum esquema de bônus conforme atingimento dos resultados.
Algumas empresas oferecem almoço, normalmente ao estilo holandês: pão, frios, sopa e leite (isso mesmo, leite). Quase todas deixam a disposição das pessoas café, chás, frutas, snaks e espaços alternativos para fazer o trabalho. Inclusive fazer home office eventualmente é normal, assim como horários flexíveis. O importante não é tanto quando e onde (menos micro-gestão), mas sim chegar aos objetivos acertados dentro do prazo (gestão por resultados).
Trabalhar na Holanda | Benefícios para a Família
A Holanda têm alguns incentivos interessantes para quem tem filhos. Um deles é o Child Benefit (kinderbijslag) disponível independentemente da situação dos pais em relação ao trabalho. Seria um incentivo para auxiliar nos custos relativos à criação dos filhos. O subsídio é pago 4 vezes ao ano, sendo (valores 2018):
>> 201,05 € por criança, para crianças de 0 a 5 anos;
>> 244,13 € por criança, para crianças de 6 a 11 anos;
>> 287,21 € por criança, para crianças de 12 a 17 anos;
Para ser elegível é preciso estar registrado e vivendo na Holanda. Em alguns casos é possível viver em outro país caso ele tenha um acordo de segurança social com a Holanda ou estiver segurado pelo esquema holandês de benefícios a crianças (AKW). O valor é depositado diretamente na conta cadastrada via Sociale Verzekeringsbank (SVB). Para solicitar basta seguir os passos indicados neste site usando seu DigiD.
O segundo é o Childcare Allowance (kinderopvangtoeslag), uma ajuda de custo para os custos relativos ao Day Care ou After School, caso ambos os pais trabalhem, estudem ou estejam seguindo um curso de integração. O valor do auxílio é calculado conforme o rendimento dos pais e o número de horas necessárias. Para ser elegível, além dos critérios acima, é preciso ter um visto válido de permanência na Holanda, pagar por parte dos custos, escolher uma das creches registradas, ter os filhos registrados no mesmo endereço e ainda sem terem iniciado a educação secundária (após o grupo 8, 12 anos).
É possível receber ajuda de custo de no máximo 230 horas por criança / mês, para no máximo os seguintes valores por hora:
>> 7,45 € para Child Care;
>> 6,95 € para Out-of-school ou After-School care;
>> 5,91 € para child minders (cuidadoras).
Acima destes valores ainda é possível receber o beneficio, mas se por exemplo, a creche custar 7,85 € por hora você não terá o subsídio sobre os 0,40 € da diferença.
Esta é a página oficial com todas as informações, aqui tudo sobre impostos e outras taxas. Esta empresa faz a ponte entre o governo e os pais, ajudando em toda a documentação. No site deles há uma calculadora que ajuda a fazer a simulação de um jeito bem simples.
Trabalhar na Holanda | Alternativas flexíveis
Chegando então onde interessa, abaixo estão os três caminhos que pesquisei até agora para melhor aliar carreira e filhos estando na Holanda.
Trabalhar menos horas - Mama Dag & Papa Dag
A licença maternidade por aqui não é nada demais. São 16 semanas apenas e é tão comum quanto no Brasil voltar ao trabalho e deixar o bebê num day care, ainda que aqui existam outras variações para este modelo. O que é diferente é a flexibilidade para adoção de cargas horárias diversas. O mais comum é o Parental Leave (ouderschapsverlof) onde ambos os pais podem optar por trabalhar menos horas (26 vezes sua carga horária), obviamente também ganhando menos (um dia a menos seriam 32 horas, 20% a menos de salário).
Este tempo pode ser distribuído de diferentes maneiras até que a criança complete 8 anos e se volte a trabalhar 40 horas. Digamos que você tenha um filho de até 8 anos, então teria direito a:
Você pode tirar esta licença de uma só vez, ou, mais comumente, tomar um dia por semana (o famoso mamadag "dia da mãe" ou papadag "dia do pai") por 2 anos e meio ou mais (contando 52 semanas por ano).
Quem tem família por aqui normalmente intercala. Um dia com a mãe, um dia com o pai e três dias em Day Care ou After School, ou ainda, um dia com os avós maternos, outro com os paternos e só um dia na creche. É uma combinação super saudável para todos. Há ainda muita gente sem filhos que simplesmente opta por trabalhar menos horas semanais, é super normal e ok para o empregador, já que os custos também são menores.
Para quem está em busca de um trabalho mais genérico, algo administrativo por exemplo, customer service, vendas, serviços, etc, é sempre possível encontrar cargas horárias mais abertas e flexíveis, com plantões ao longo da semana, escalas de meio período ou de apenas 2 ou 3 vezes por semana.
Trabalhar quando quer - Vida de Autônomo
Se tornar um pequeno empresário na Holanda é relativamente simples. O modelo mais comum é o (enmanszaak - one-person business). É necessário ter visto de residência válido, registrar-se na câmara de comércio (50 € de taxa) e no Belastingdienst (Dutch tax office), que fornecerá seu BWT ou VAT number (com o qual você poderá "freelar" em sites como o Freelancer.com).
Os impostos são de 21% sobre as vendas ou faturamento (BWT tax), coletados 4 vezes ao ano através de declarações. É possível deduzir deste valor alguns custos como transporte, equipamentos e materiais. Sob o regime de pequenas empresas (kleineondernemersregeling), se a taxa anual (BWT) coletada for de até 1.883 € (após deduções), é possível pagar menos ou nenhum BTW. É claro que para manter um pequeno negócio é preciso ser minimamente organizado, manter registros fiscais, administrativos e todo o resto para as declarações, e eventualmente contratar um contador para tal.
Existem alguns benefícios associados, como por exemplo, o zelfstandigenaftrek (subsídio de propriedade de empresas privadas - private business ownership allowance), onde os freelancers devem trabalhar um mínimo de 1.225 horas por ano em seu novo negócio. Para isso é preciso manter registros das horas trabalhadas, reuniões e toda a documentação necessária para comprovar o tempo dedicado ao negócio.
Além de poder trabalhar a quantidade de horas que se deseja e especialmente, com flexibilidade para trabalhar quando melhor convém à dinâmica da família, uma vantagem associada a este modelo é o Childcare Benefit, conforme citei acima. Este subsídio funciona também para quando um dos pais está estudando, o que me leva ao próximo tópico.
Investir na Formação - Master e Idiomas
A Europa tem uma oferta fantástica de cursos e universidades de muito prestígio e qualidade. Os custos são altos para estudantes sem passaporte europeu (em torno de 15 mil euros ano para um Master), mas existem bolsas para brasileiros. Para os que tem um passaporte europeu, este custo é parcialmente subsidiado pelo governo e fica em torno de 2 mil euros. Apesar de exigirem uma boa dose de dedicação, um Master em universidades como a UVA ou VU é relativamente curto, 1 ano de duração, com a maioria iniciando em setembro, com aulas normalmente 4 vezes por semana (das 10 da manhã as 15 hs, por exemplo). O esquema é mais flexível durante os meses de desenvolvimento da tese.
Para verificar os critérios para ser elegível ao programa ou bolsa basta dar uma navegada pelos sites. Aqui nesta página está um resumo dos documentos mais comumente solicitados, e aqui um localizador de cursos que pode ser bastante útil. Algo que sem dúvida será necessário é o exame de proficiência em inglês, e só o fato de investir um tempo para estudar uma nova língua já é uma incrível oportunidade. Neste post existem algumas dicas para aprender inglês de uma vez por todas. Se está em busca de escolas, algumas boas indicações em Amsterdam são: Uva Talen (na média 620 € para um módulo de 40 horas), British Language Training Centre (na média 595 € para um módulo de 46 horas) e Mix Tree (mais alternativo, onde eu estudei, 380 € para um módulo de 30 horas).
Importante: os dados apresentados neste post são referentes ao ano de 2019. Fique atento porque os valores apresentados para taxas, subsídios, valores de salário mínimo mudam anualmente.