Mesmo que você não seja um cidadão holandês é possível investir na compra de uma casa na Holanda. Os preços das casas por aqui aumentaram acentuadamente nos últimos anos, em parte devido à queda nas taxas de juros e uma oferta cada vez menor de casas. O mercado realmente está aquecido, por uma série de fatores (este post é super esclarecedor neste sentido), os aluguéis aumentam, as pessoas acabam vivendo cada vez mais distantes dos grandes centros e a disputa para conseguir uma casa só cresce.
Por essas e outras (especialmente pelas taxas de juros pequenas, estáveis e o grande percentual que pode ser financiado) a opção de compra de um imóvel é algo a se estudar. Mas quanto custa comprar uma casa por aqui? Quais são as taxas envolvidas? Quais as pegadinhas e pontos de atenção? Neste post deixei tudo explicadinho com vários links para leituras complementares para quem quer ter um endereço holandês pra chamar de seu.
Sistemas de Lance
Salvo raras exceções para propriedades e regiões menos “concorridas” o sistema de compra de imóveis funciona através de “bids” ou seja, lances. Funciona assim: você identifica uma casa que têm interesse através de um dos sites de venda de imóveis ou imobiliárias e agenda uma visita.
Durante a visita você terá cerca de 30 minutos para avaliar a casa juntamente com outras famílias interessadas (isso mesmo, você tem só este tempinho e uma única visita para decidir por possivelmente o maior investimento da sua vida… eu levo mais tempo pra comprar um sapato).
Algumas propriedades com maior número de interessados têm “open days”, onde a casa pode ser visitada durante todo o dia sem horário marcado. Já visitamos casas nessa situação com mais de 30 pessoas ao mesmo tempo. Algumas casas têm mais de 200 interessados na lista de espera para lance ou visita. Durante o período da pandemia as visitas são limitadas de forma a atender uma única família de cada vez, o que torna o processo ainda mais concorrido.
Durante a visita, o corretor responsável entrega um formulário aos interessados e informa a data e horário limite para envio do lance. Este prazo é bastante curto, normalmente poucos dias após a visita. Os vendedores esperam receber em média 10% a mais do valor anunciado para o imóvel, o que já serve como uma indicação na hora de estabelecer um limite de preço para as buscas. Certamente existem casos em que o imóvel é vendido pelo valor anunciado, mas o que vimos até então na grande maioria dos casos foram valores superiores aos 10%. O mercado está absurdamente inflacionado.
Com os lances recebidos, os proprietários escolhem o vencedor. Nem sempre ganha o maior lance, uma vez que os donos podem considerar aqueles que parecer ter melhores condições de crédito, os indicados pela imobiliária ou mesmo os que decidirem ser os felizardos a receber o direito de comprar a casa.
Se os lances forem parecidos é possível ainda que os proprietários dêem um dia adicional para que os interessados aumentem seus lances. Sim, é um leilão e é cruel mesmo. Neste sentido é importante contar com a ajuda de um corretor com mais experiência para avaliar a casa, pois se a ideia for fazer um financiamento, na etapa seguinte o banco fará uma avaliação formal e financiará somente o montante que equivale ao valor real de mercado do imóvel, e o comprador terá que desembolsar a diferença. Ninguém quer fazer um mau negócio e comprar uma propriedade por um valor superior ao que ela realmente vale, não é? Por isso é preciso um certo cuidado com o esquema dos lances. Neste site é possível comprar relatórios completos de avaliação com informações bem detalhadas.
Há quem utilize a estratégia de sair da visita e imediatamente dar um lance com um prazo de validade curto. Algo como: “Pagamos X pela casa, mas nossa oferta é válida somente até amanhã”. É um jeito mais ousado de tentar induzir os vendedores a encerrar antes o sistema de lances. Deu certo para alguns amigos, mas é preciso considerar que em alguns casos o vendedor que já tem outras dezenas de visitas agendadas para o dia poderá usar o valor deste lance como uma informação para barganhar com os demais, algo como um valor mínimo, buscando alcançar lances maiores.
Nas visitas normalmente as casas contam com folhetos bem detalhados indicando o que fica e o que não. Vale dar uma olhada, pois algumas propriedades deixam a cozinha completa, por exemplo, enquanto outras levam até os spots de luz.
Uma vez que os lances foram dados a casa fica em situação de "pré-venda", período em que se providenciam o contrato e o financiamento com o banco, o que pode levar alguns meses. Depois de tudo certo a propriedade muda então para o status de "vendida".
Corretor de Imóveis
Existem dois profissionais chaves envolvidos neste processo. O primeiro deles é o Real Estate Broker ("Makelaar" em holandês), ou seja, o corretor de imóveis. A função dele é apoiar o comprador na escolha e avaliação da casa. As imobiliárias normalmente contam com sistemas automáticos de envio das opções por e-mail a seus clientes, através de filtros pré-cadastrados com as características da propriedade procurada.
Diferentemente do Brasil, o corretor não vai ficar "caçando" as melhores alternativas para você, mas ele poderá agendar visitas para os imóveis indicados e irá acompanhá-lo de forma a entender suas preferências e avaliar as opções.
Não é realmente necessário a contratação deste profissional, mas num mercado extremamente aquecido e concorrido ele sem dúvida auxilia no processo. O broker tem informações privilegiadas a respeito do imóvel e sabe da existência da casa antes dela ser publicada nos portais (inúmeras vezes achamos algo que nos parecia ideal, mas a casa já estava vendida no dia em que foi publicada). Além disso, ele normalmente têm acesso ao número de interessados e pode ajudar na hora de estipular o valor do lance. Depois de buscar em "carreira solo" uma opção por mais de um ano decidimos contratar.
É importante contudo decidir em primeiro lugar qual a região em que se deseja morar, para então contratar o agente imobiliário que atua naquela área. Como tantas outras profissões, esta depende de relacionamentos e de um conhecimento mais aprofundado da região para indicar se a vizinhança é ou não uma boa opção e o histórico de construção de cada uma das áreas da cidade. Como expatriados, sem muito conhecimento prévio, considero isso super valioso. Nessa página está uma lista de agentes por região.
Os custos para contratação deste profissional variam de 1 a 2% do valor do imóvel + impostos (21% de VAT). Este valor não é dedutível. Normalmente as imobiliárias têm uma taxa fixa no início do contrato, e caso o negócio seja fechado o comprador paga o restante do valor.
Consultor Financeiro
Outra figura chave no processo é o Mortgage Advicer (Hypotheekadvies). A contratação deste profissional é obrigatória e os custos envolvidos são dedutíveis. O valor varia de € 1.500 a € 3.500, pagos no momento da transferência do imóvel.
Uma vez assinado o contrato de compra e venda, é ele quem irá providenciar todo o necessário para o financiamento do imóvel, desde a análise de crédito, escolha do banco, avaliação formal do valor da casa e estabelecimento de todas as condições do empréstimo (qual o máximo valor a ser financiado, taxa de juros, etc). Obviamente é muito importante ter uma prévia destas informações antes de realizar o lance, especialmente o valor máximo possível para financiamento. Algumas empresas especializadas fazem esta avaliação prévia sem compromisso.
Em função da economia bastante estável e juros baixos, as hipotecas (ou financiamentos imobiliários) se tornam uma opção bastante interessante. Existem modalidades de contrato em que é possível "congelar" a taxa de juros por até 20 anos. O valor da parcela acaba ficando um pouco mais alta, mas se a segurança aumenta bastante, já que são contratos longos, de até 30 anos.
Se você tem dúvidas a respeito dos tipos de financiamentos disponíveis e quais as condições para solicitar uma hipoteca este site pode ajudar.
Tabelião e Taxas de Transferência
O Notary ("Notaris" em holandês) ou Tabelião é definido no momento do contrato e é ele quem fará de fato a transferência da propriedade para o nome dos compradores. Neste momento toda a documentação já está acertada, tanto para o contrato, quanto para o financiamento.
Na data da transferência de posse da casa fica estabelecido o pagamento de 10% do valor de venda do imóvel, que pode ser realizado através de transferência ou carta garantia do banco.
É obrigatória a presença de um tradutor junto ao notary neste dia no casos em que uma ou mais das partes não seja um cidadão holandês. O tradutores deve ser credenciado, por isso a imobiliária deverá buscar uma opção antecipadamente. Os honorários do tradutor giram em torno de € 200.
Neste momento também são acertadas todas as taxas de transferência (que são várias!). Para não incorrer em nenhuma falha que o leve a me culpar depois, indico que veja a lista completa de taxas com valores estimados aqui.
Importante também lembrar que é obrigatório fazer um Seguro do Imóvel antes da compra, conforme estabelecido pelo banco escolhido para o financiamento. Alguns deles também indicam a obrigatoriedade de um Seguro de Vida, o que é sempre recomendável ao se comprometer com um investimento como o de um imóvel.
Pontos de Atenção
Entre os inúmeros pontos que precisamos ficar atentos ao comprar uma casa, destaco alguns que considero como mais importantes por serem menos usais para nós, expatriados:
>> Compra do terreno: em algumas regiões da Holanda você não compra a casa com o terreno (freehold), mas apenas a casa e uma licença para uso do terreno (ground lease - leasehold) que deve ser renovado a cada período de tempo, conforme a região.
>> Energy Label: as casas são classificadas conforme seu consumo de energia, de A (melhor desempenho) até G (pior desempenho). As novas construções têm por obrigatoriedade ter selo A, mas este é sem dúvida um ponto fundamental na hora de avaliar os imóveis, especialmente os mais antigos.
>> Fundações: casas construídas nos centros mais antigos, como a região central de Amsterdam, por exemplo, têm estacas como fundação. A prefeitura realiza uma inspeção periódica de segurança e caberá aos proprietários arcar com os custos caso seja necessária uma manutenção.
>> Direção do sol: algumas imobiliárias fornecem mapas interativos com a posição e movimentação do sol pelas estações do ano. Como por aqui o inverno pode ser longo, as estações são bem marcadas e os dias de sol são celebrados com muita alegria, é importante avaliar a presença de luz natural sobre a casa.
>> Escolas e Sistema Médico: acesse o post sobre escolas na Holanda para ver a avaliação das instituições na região e veja como funciona o sistema de saúde para verificar as opções próximas ao novo endereço antes da compra.
>> Segurança: existem mapas interativos que indicam a segurança por determinadas zonas de cada cidade. No caso de Amsterdam a prefeitura disponibiliza diversos mapas onde tudo pode ser consultado, desde a qualidade do ar até a ocupação das terras. Vale a pena dar uma pesquisada.
>> Uso do imóvel: alguns imóveis são para uso exclusivamente residencial. Em outros casos o banco permite que o imóvel seja locado somente após determinado número de anos. É importante portanto estar atento às intenções de uso para o imóvel versus as condições específicas de cada opção.
>> Prazo de liberação da casa: enquanto a velocidade da venda é absurda (3 a 7 dias e a casa já foi), o tempo para a entrega das chaves pode ser longo. A média é de 3 meses de espera, daí a necessidade de um planejamento com antecedência.
Com certeza existem vários pontos de atenção. Se quiser ir mais fundo, nesse link você encontra um check-list com outras dicas importantes para não esquecer de nada na hora de comprar.